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Por que Israel é o país estrangeiro com mais empresas listadas na Nasdaq.

Uma visita ao berço dos unicórnios e uma das maiores potências de tecnologia do mundo. Por Gabriel Santos

27/08/2022 às 05h06
Por: Joselio de Sousa Reis Fonte: InfoMoney
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Getty Images
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Chega a ser quase inacreditável que um país com área similar à do Estado de Sergipe (menor Estado territorial brasileiro), população menor que a da cidade de São Paulo, escasso em recursos naturais e em constante estado de guerra e conflitos políticos tenha mais empresas listadas na Nasdaq do que qualquer outro país no mundo, com exceção dos Estados Unidos, país-sede da Nasdaq. Mas o que faz de Israel um grande berço de “unicórnios” e uma das maiores potências high-tech do mundo?

Há algumas semanas, tive a oportunidade de visitar o país por meio de um programa de inovação da StartSe. Durante uma semana, estive em contato com empreendedores, diretores e idealizadores dos mais diversos segmentos, conhecendo a fundo produtos de inovação que vão desde o Iron Dome – um dos mais avançados sistemas de defesa antiaérea do mundo – até o Magen David Adom, uma espécie de Cruz Vermelha bem high-tech de Israel. Em um processo de imersão cultural e tecnológica, consegui extrair um pouquinho das características que fundamentam o sucesso da nação das startups, dentre as quais destaco:

Jewish Chutzpah: Chutzpah é uma palavra iídiche, derivada do hebraico. No contexto israelense, simboliza a audácia e a coragem de se falar o que pensa, sem rodeios, por mais chocante que seja a mensagem. De outras perspectivas culturais, incluindo a brasileira, o conceito pode ser facilmente confundido com arrogância, grosseria ou prepotência. Porém, em um mundo completamente digital, em que o foco e atenção das pessoas são cada vez menores, Chutzpah é o novo carisma. É a partir dessa comunicação direta, clara e audaciosa que o povo israelense garante respostas rápidas e ciclos de feedbacks menores, promovendo crescimento e amadurecimento com agilidade.

Treinamento militar: assim que completam 18 anos, os jovens são convocados ao serviço militar nas forças de defesa israelense, Israel Defense Forces (IDF). Os homens servem três anos e as mulheres dois. O treinamento militar contempla desde situações sérias de vida e morte, que os ensinam a pensar e agir rapidamente, tomando riscos e assumindo responsabilidades sob condições estressantes, até conhecimento multidisciplinar profundo, incluindo tecnologias de ponta. Mais que isso, o IDF é conhecido por sua horizontalidade hierárquica. Ou seja, é bem comum ver pessoas muito jovens em cargos de muita responsabilidade. Outra característica marcante é que os soldados do IDF são encorajados a questionar as autoridades se tiverem dúvidas sobre as decisões tomadas pelos mais seniores, exercendo a filosofia Chutzpah. O resultado disso são jovens com um grande conhecimento multidisciplinar, perspectiva super ampliada e alto grau de maturidade.

Tolerância à falha: é de senso comum entre o povo israelense que é quase impossível inovar sem antes ter falhado inúmeras vezes. Logo, o conceito de “falha construtiva” é amplamente difundido em sua cultura. Abraçar a falha e aprender com ela também faz parte de um mecanismo que inibe a cultura do medo. Se uma pessoa é punida por baixa performance ao tentar melhorar seu trabalho, os profissionais das gerações subsequentes não tentarão coisas diferentes e, assim, a sociedade ficará estagnada. No IDF, por exemplo, performance, seja ela alta ou baixa, em situações reais ou simuladas, é tratada de forma neutra. Ou seja, o que importa é a jornada e como a pessoa se comporta durante o processo. Enquanto houver tomada de riscos de forma inteligente e responsável, mesmo se o resultado for falho, existe algo a se aprender e isso é muito valorizado.

Cultura do questionamento: desde muito cedo os israelenses são incentivados a questionar tudo. Se eles não entenderem algo, imediatamente deixarão isso claro e falarão sem rodeios. Tanto no serviço militar quanto no empreendedorismo, isso mantém o alto padrão de qualidade e “barra alta” em tudo o que fazem. Isso também faz com que profissionais em altos cargos mantenham seu nível de conhecimento elevado, buscando sempre profundidade nos assuntos discutidos, pois eles sabem que serão questionados por todos ao seu redor. Israel é considerado um dos países mais educados do mundo em termos de ensino superior e diploma universitário. Logo, é natural que até mesmo pessoas em cargos executivos possuam um alto grau de conhecimento nas áreas em que atuam e, com isso, perpetuem a cultura acadêmica do questionamento para evolução do estado da arte.

Trabalho coletivo: em Israel, o título ou rótulo importa muito pouco. Não interessa se você é o CEO ou um estagiário, todas as opiniões são discutidas e levadas em consideração e no final o coletivo fala mais alto. Até por viverem em constante situação de risco, por conta do permanente estado de guerra que o país está com seus vizinhos, é vital que os israelenses atuem de forma muito unida, sempre subindo a barra e trabalhando para o sucesso uns dos outros. Existe uma grande partilha de conhecimento entre os profissionais e, seja na força de defesa ou no ambiente corporativo, o interesse do coletivo é colocado sempre acima do interesse individual.

Venture capital e incentivo governamental: grande parte do sucesso das startups de Israel está fundamentado no grande número de fundos de venture capital do país. Motivado por um grande plano de estabilização econômica no início da década de 90 o governo israelense estabeleceu o projeto Yozma (palavra hebraica para “iniciativas”). O projeto tinha o objetivo de alavancar o setor privado e atrair investimento de capital estrangeiro. Com cobertura de até 80% do risco assumido, incentivos fiscais e inserção de capital de fundos governamentais (em alguns casos até dobrando o dinheiro investido por fundos estrangeiros), o projeto governamental foi um sucesso. Entre 1991 e 2000, o investimento anual em venture capital saltou de US$ 58 milhões para US$ 3,3 bilhões. O número de empresas iniciadas com esse capital foi de 100 para 800 e a receita em tecnologia evoluiu de US$ 1,6 bilhão para US$ 12 bilhões. Em 2021, de acordo com o centro de pesquisas israelense IVC, esse investimento foi de US$ 25,6 bilhões, um crescimento de quase 150% quando comparado com 2020.

É inegável que a fama de nação das startups e o sucesso econômico de Israel seja minimamente intrigante dado todo contexto histórico, político e religioso do país. Essa confluência de princípios culturais agressivos, alto nível educacional, disciplina militar e apoio financeiro governamental e exterior é extremamente difícil de se replicar e com certeza serve de grande inspiração a outros países.

Há muito para aprender ainda com o povo israelense e, definitivamente, cultura evolutiva é um ingrediente fundamental para o caminho da inovação.

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